“A cynic is a man who knows the price of everything and the value of nothing” (Oscar Wilde)
Uma reflexão do autor a respeito destas publicações
LEITORES HABITUAIS DESTAS MAL TRAÇADAS saberão que nelas se encerra uma dicotomia: o desafio de conciliar uma atividade eminentemente técnica, especializada e intensiva em dados, como é a gestão quantitativa, a um relato qualitativo que seja, a um tempo, acessível, informativo e – tanto quanto possível – prazeroso de ler. A realidade é que, a despeito de nossos melhores esforços, o resultado não raro é um ser híbrido, beirando grotesco, entre análise político-econômica convencional e estatística – o equivalente literário do ornitorrinco.
A tarefa de escrever cartas de investimento é relativamente mais simples para os gestores tradicionais, aqueles que, por ofício, praticam a ciência esotérica conhecida por análise fundamentalista. “Fundamento” é termo mal definido: grosso modo, fundamentos são fatores que determinam o “real” valor de um ativo. Exemplos de fundamentos são informações contábeis de uma empresa, o posicionamento competitivo da empresa dentro de seu setor, a situação do setor no contexto mais amplo da economia, as condições macroeconômicas e financeiras que, por sua vez, determinam as condições econômicas e, por fim, os eventos políticos que repercutem sobre todos os demais fatores. Esta teia complexa de forças determina o chamado “valor intrínseco” do ativo, uma quintessência que cristaliza a riqueza potencial (ou, igualmente místico, o valor presente de seus fluxos de caixa futuros). Valor intrínseco e preço – este, sujeito a intempéries de mercado – nem sempre andam juntos. O papel do gestor fundamentalista, então, é garimpar ativos cujo preço esteja em desalinho com o valor intrínseco na expectativa de realizar um ganho quando ambos, eventualmente, se realinharem. A profissão de fé fundamentalista requer certas crenças: que o gestor possua um mapa mental – um modelo qualitativo – que lhe permita navegar por mercados turbulentos sem perder de vista os fundamentos. Que lhe permita, em qualquer instante, separar ruído (o proverbial joio) de mudanças estruturais (o proverbial trigo). Sobretudo, exige fé no dogma de que preços não refletem toda informação supostamente contida nos fundamentos – isto é, que de fato exista uma discrepância entre preço e valor que o gestor possa explorar.
Que estas suposições sejam verdadeiras é objeto de acalorado (e inconclusivo) debate. De uma coisa, porém, ninguém duvide: análise fundamentalista, com sua peculiar combinação de ciência e metafísica, rende deliciosas cartas de investimento. De fato, nas últimas décadas as epístolas financeiras se consolidaram como um subgênero literário, atraindo uma pequena mas fanática seita de exegetas dedicada a interpretar encíclicas de sumo sacerdotes como Warren Buffett, lendário investidor e um expoente do gênero. Na carta, o gestor fundamentalista tem uma tela em branco para expressar sua particular interpretação dos astros e expor as razões que a própria razão desconhece.
Gestão quantitativa, por outro lado, reza por uma cartilha julgada herética por fundamentalistas. Gestores quantitativos são agnósticos sobre os dois pilares fundamentais daquela escola: fundamento e valor intrínseco. O gestor quantitativo nada presume saber sobre os mistérios do valor, esta forma platônica suspensa no éter atemporal, muito menos sobre o valor “intrínseco”. Esta limitação intelectual cria, de cara, um problema: seres humanos interpretam o mundo através histórias, e gestores quantitativos não têm histórias para contar. Se o leitor desavisado algum dia se encontrar num coquetel ao lado de um gestor quantitativo, é desaconselhado a puxar conversa sobre mercados. Sem dispor de uma metafísica do valor, o gestor quantitativo pouco terá a dizer sobre se a bolsa está cara ou barata. Tampouco poderá opinar sobre a política monetária do Banco Central, o valor do dólar ou os rumos da economia (gestores quantitativos são, em geral, seres socialmente desajeitados; recomenda-se evitá-los em coquetéis salvo se se queira conversar de distribuições probabilísticas ou filosofia). Diferente dos gestores fundamentalistas, o gestor quantitativo não possui mapa para navegar por complexos eventos políticos ou econômicos. Ele comunga de apenas uma crença: de que o gigantesco volume de dados financeiros digitais hoje disponível e facilmente acessível por qualquer um, pode ser dissecada com sofisticadas técnicas estatísticas e processada com tecnologia de informação avançada. Em alguns casos, este penoso trabalho rende modelos capazes de prever o comportamento de preços com razoável taxa de acerto. Os modelos nada dizem sobre valor (ou causalidade) mas permitem ao gestor estimar probabilidades da bolsa subir ou cair.
Estatística e modelos probabilísticos não constituem, exatamente, o conteúdo mais sexy para uma carta de investimento (tentamos banir este tipo de conteúdo para apêndices técnicos). Há, porém, um subterfúgio de que se pode valer o gestor quantitativo, com um pouco de boa vontade: os dados que ele analisa são influenciados pelos mesmos eventos político-econômicos que figuram nas cartas de gestores fundamentalistas e servem, igualmente, para explicar seus resultados, a posteriori, em nível macro. Ele observa, por exemplo, que a bolsa subiu quando o governo anunciou um programa de privatizações e caiu quando a Coréia do Norte lançou mísseis balísticos intercontinentais. Sem muita preocupação com rigor ou formalismo, ele infere que estes eventos foram responsáveis pelos sinais de compra e venda gerados pelos modelos. E viu que era bom. Ele interpreta o desempenho dos modelos à luz destes eventos. E viu que era bom. Ele tece uma narrativa consistente, que amarre uma coisa à outra. E viu que era bom.
Um ornitorrinco, enfim.
Desempenho agosto de 2017: Fundo Zarathustra
O Fundo Giant Zarathustra FIM rendeu +0,23% no mês de agosto. Os destaques positivos foram os modelos de volatilidade, o modelo de operações intradiárias em dólar e os modelos de reversão à média em ações. O modelo de tendências de dólar que vinha posicionado desde julho deu saída, devolvendo parte dos ganhos auferidos naquele mês e fazendo com que os modelos de tendências ficassem negativos no mês. O hedge de opções respondeu por um custo de cerca de 0,5% no mês.
Veja os dados consolidados do fundo