“Who holds the devil, let him hold him well, He hardly will be caught a second time.”
Johann wolfgang von Goethe, Faust: Part 1
Fundo Zarathustra em 2018
O Fundo Zarathustra FICFIM rendeu 15,44% em 2018, equivalente a 238% do CDI no ano. O ganho do quarto trimestre foi de 4,51% (293% do CDI no período) e foi afetado, sobretudo pela queda dos juros e valorização da bolsa e do Real. Foram destaques no trimestre os modelos de tendências, bem como os modelos de algoritmos de ML e momentum de ações. A equipe de gestão foi expandida em 2018 com a adição de reforços nas áreas de modelagem, dados e execução, que levaram a significativos avanços em pesquisa e aperfeiçoamentos dos processos internos, tendo contribuído para o excelente resultado de 2018. A equipe está otimista com as perspectivas para 2019 e continua investindo em pesquisa e processos, almejando objetivos ainda mais ambiciosos para o ano.
Métricas de retorno e desempenho comparativas do Fundo Zarathustra, para anos de 2018:
Zarathustra | IHFA | IFMM | |
---|---|---|---|
Alpha | 12,20% | -1,49% | -1,25% |
IMA-B | IRFM | DOL | IHFA | IFMM | |
---|---|---|---|---|---|
Correl. | -0,3 | -0,4 | 0,3 | -0,1 | -0,1 |
Zara. | IMA-B | IRF-M | DOL | IBOV | IHFA | IFMM | |
---|---|---|---|---|---|---|---|
Sharpe | 0,65 | 1,15 | 1,21 | 0,32 | 0,47 | 0,12 | -0,03 |
Sortino | 1,10 | 1,81 | 1,76 | 0,44 | 0,69 | 0,17 | -0,04 |
Retorno | 15,5% | 13,1% | 10,8% | 10,2% | 15,2% | 6,8% | 6,3% |
Des. Pad. | 14,3% | 5,5% | 3,4% | 13,7% | 22,0% | 2,8% | 2,7% |
Contexto internacional – 2018
O último trimestre de 2018 foi marcado pelo retorno de volatilidade extrema aos mercados globais. Dezembro — em geral, mês morto por causa dos feriados — este ano foi brutal: vendas pesadas e persistentes, movimentos extremos e “bizarras” oscilações intra-diárias reduziram muito investidor veterano a pilhas trêmulas de nervos. O longo bull market da bolsa americana, que completará dez anos em março (se chegar lá), escapou por um triz de se encerrar após as fortes quedas no Natal. O bear market só foi espantado por uma espetacular reversão, no apagar das luzes. Ainda que o pior tenha sido evitado, o índice S&P 500 fechou o ano com uma queda de mais de 6%, pior desempenho desde a crise financeira de 2008 e o pior mês de dezembro desde a Grande Recessão.
Em retrospecto, é possível identificar alguns catalisadores para o colapso: o esvaecimento do estímulo proveniente do corte de impostos, aprovado nos EUA no ano anterior e forte impulsionador da bolsa, na primeira metade do ano; o implacável aperto do torniquete monetário, pelas mãos impassíveis do novo governador do FED, Jerome Powell; a escalada na disputa comercial entre as duas maiores potências do planeta; o desempenho decepcionante das empresas de tecnologia. Nada disso, porém, abalou seriamente a economia americana, que continuou crescendo em ritmo saudável.
Para entender o ataque de nervos do mercado, é preciso olhar para a política americana — em particular, para o caos e disfunção que começou a tomar conta da Casa Branca a partir de meados do ano. Um dos sintomas desse caos é a rotatividade de pessoal que, no governo Trump, bate recordes. Em dois anos, dúzias de funcionários deixaram a administração (não são poucos a apontar semelhanças entre esse governo e o reality show estrelado pelo presidente, “The Apprentice”). Outro sintoma é que, decorridos dois anos, centenas de cargos governamentais importantes permaneciam vagos.
Partido Republicano e mercado puderam, contudo, em grande parte ignorar o tumulto desse carrossel na certeza de que, acontecesse o que acontecesse, haveria um núcleo duro de membros experientes de gabinete — os chamados “adultos no recinto” — distantes da vertigem alucinante do dia-dia, exercendo supervisão e influência moderadora sobre o impetuoso presidente. Faziam parte deste núcleo Rex Tillerson, Secretário de Estado; Gary Cohn, chefe do Conselho Econômico; os generais McMaster, Kelly e Mattis e a embaixadora da ONU, Nikki Haley. Até meados do ano, essa barganha faustiana rendeu bons frutos: o mercado ganhou um corte de impostos que transferiu uma bolada às empresas e turbinou as bolsas às custas de um rombo gigantesco no orçamento. Os republicanos ganharam duas nomeações de juízes conservadores à Suprema Corte e dezenas para as cortes federais. Medidas mais extremadas — muralhas, barreiras, guerras comerciais, ameaças a aliados e apaziguamento de inimigos — ficaram só na retórica ou se perderam em meio à disfunção administrativa.
Esse arranjo começou a ruir no segundo trimestre, quando os “adultos” foram saindo ou sendo “saídos”: Tillerson foi demitido por tuíte, após ser escanteado das negociações com a Coreia do Norte; Cohn renunciou em protesto às primeiras ofensivas tarifárias; McMaster e Kelly foram dispensados, sem cerimônia, por um presidente avesso à disciplina que a dupla tentou impor. Haley anunciou sua saída, dizem as más línguas, para preservar sua reputação numa possível futura candidatura presidencial. O último “adulto” a deixar o recinto, na esteira de súbita decisão presidencial de retirar tropas da Síria, foi Mattis (que se despediu com uma carta pouco lisonjeira ao presidente).
No lugar dos “adultos” foi entrando gente que, em comum, tem o hábito de dizer “sim” incondicionalmente ao presidente. Sem amarras, Trump foi descendo a profundezas sombrias, fazendo declarações (ou tuítes) cada vez menos ancorados na realidade, exibindo traços crescentes de destempero e paranoia. Não ajudou, claro, o fato de que a investigação de Robert Mueller estivesse se aproximando perigosamente do presidente, indiciando e fechando acordos de delação com membros de seu círculo íntimo (tema para uma próxima carta). Tampouco a derrota que sofreu nas eleições legislativas, que devolveram a maioria no Congresso à oposição e abriu novas avenidas de inquérito — sem falar na possibilidade real de impeachment. A política foi se tornando mais extremada: rompimento unilateral do acordo com Irã, separação de famílias de imigrantes, militarização da fronteira com México, uma bizarra cúpula com o presidente da Rússia, críticas públicas ao governador do FED (passando por cima do protocolo milenar segundo o qual um presidente em exercício jamais comenta decisões do FED). Talvez a gota d’água tenha sido a decisão de fechar o governo como forma de forçar o congresso a aprovar verbas para o fetiche de Trump, a “grande e lustrosa muralha” na fronteira sul. Mercados, atônitos, desabaram. O secretário Mnuchin correu para apagar o incêndio mas, ao declarar que bancos “não tinham qualquer problema de liquidez” (quem perguntou??), acabou jogando mais gasolina na fogueira. Mercados desabaram outra vez. Começou a ficar dolorosamente óbvio que o presidente, livre, leve e solto, era um proverbial “macaco com metralhadora”.
Contexto Nacional – 2018
Em meio a toda essa confusão o mercado brasileiro foi sendo esticado em direções opostas: se, por um lado, sofreu com o colapso das bolsas globais, por outro surfou uma onda de euforia com a eleição de Jair Bolsonaro.
Escaldada pelo fenômeno Trump, a imprensa mundial não hesitou em rotular Bolsonaro como a mais recente encarnação do belzebu nacional-populista — essa figura que se multiplica pelo globo e define o zeitgeist contemporâneo. O figurino populista certamente cai bem em Bolsonaro: religioso, conservador, com declarada simpatia por regimes autoritários, exultante na pátria e seus símbolos na mesma medida em que demoniza “socialismo”, “ideologia”, “correção política” e outros bichos-papões (reais ou imaginários), seu discurso duro é feito sob medida para apelar ao sentimento de indignação que varreu o país nos últimos anos: com a insegurança urbana, com a longa crise econômica, com a inoperância do Estado e a corrupção endêmica do establishment político. Pegando carona no roteiro de outros populistas (notoriamente, Trump), dispensou as mídias tradicionais — de resto, antipáticas à sua candidatura — para fazer hábil uso das redes sociais. Através delas, foi capaz de mobilizar uma grande base de apoio, altamente engajada e comparável à militância que somente partidos de esquerda, em outros tempos, eram capazes de mobilizar.
Mas apesar de óbvias semelhanças com a nova safra de líderes ditos populistas (Orbán, Kaczynski, Duterte, Salvini, etc), seria um erro reduzir Bolsonaro meramente a um fenômeno populista. Apesar de seu histórico pró-estatizante e corporativista (a que jurou ter renunciado), certamente está longe do perfil tradicional do populista latino-americano (cuja marca registrada é a simbiose entre líder carismático e Estado paternalista – estratégia mais propriamente associada ao PT). Tampouco se encaixe no modelo populista europeu, caracterizado por forte xenofobia, rejeição a imigração e à globalização.
Bolsonaro cedeu à pressão de bancadas conservadoras para preencher alguns cargos do governo — notoriamente, os ministérios da Educação e Relações Exteriores — mas delegou a gestão econômica a uma equipe de tecnocratas reformistas e pró-mercado, chefiada pelo economista liberal Paulo Guedes. A agenda dessa equipe é ambiciosa: privatizar ativos estatais, enxugar a máquina pública e reduzir a intervenção do Estado na sociedade; desregulamentar, desburocratizar e simplificar tributos, abrir mercados e expor a economia à concorrência. Ao menos na esfera econômica, portanto, mais do que um típico populista Bolsonaro é um modernizador na linha de figuras como Macri, Peña Nieto ou mesmo Narendra Modi (talvez o líder com quem mais tenha em comum). O fosso econômico em que o Brasil caiu é tão fundo que, para o bem ou para o mal, o governo Bolsonaro será julgado pelo êxito na implementação de reformas econômicas urgentes. Como nos EUA, por aqui também os mercados fizeram um pacto faustiano, apostando que a agenda modernizadora prevalecerá sobre os impulsos mais ideológicos e retrógrados do presidente. Oxalá.
Nicolau Maquiavel observou, há mais de 500 anos, que qualquer aventureiro dotado de arrojo e agraciado por Fortuna pode chegar ao poder. Para se manter lá, entretanto, é necessário habilidade e perícia — o que Maquiavel chamou de Virtù. Tendo chegado à metade do mandato em situação precária, o governo Trump parece caminhar para confirmar essa antiga máxima. Presidente Bolsonaro, tome nota.
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